domingo, 5 de março de 2017



REFORMA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL OU A LEGALIZAÇÃO DE MAIS UM TRIBUTO?!?



Benedito, o seu Dito, trabalhou desde os 15 anos de idade. Quando ia para o trabalho, conheceu Guilhermina, jovem linda e formosa, que sempre estava na janela do sobrado amarelo para vê-lo passar. Não tardou, começaram a trocar sorrisos, acenos, bons dias, até que ele a convidou para ir ao cinema e nunca mais se separaram. Casaram no bairro do Bexiga. Ali tiveram seus filhos e passado algum tempo, compraram o tão sonhado apartamento, o sonho da casa própria! Economizando daqui e dali, dona Guilhemina fazendo doces para ajudar, conseguiram após longos e intermináveis anos pagar as parcelas do financiamento e quitá-lo. Ter a Escritura de Propriedade nas mãos foi um dia de Glória. Juntos, de mãos dadas, foram à Igreja da Achiropita para agradecer. Já com os filhos criados, passaram a sonhar, então, com o momento da aposentadoria para poderem viajar e passear mais. Após 30 anos trabalhando na mesma escola, seu Dito, finalmente se aposentou. O merecido descanso parecia haver chegado. Não mais ter que levantar às 5h00, não mais ter que trabalhar oito horas em pé, não mais ter que pegar o metrô lotado, não mais ter que corrigir provas e trabalhos... agora seu tempo seria dedicado à sua “Mina”, como carinhosamente costuma chamar sua mulher. No entanto, seu Dito adoeceu. Foi diagnosticado com o Mal de Parkinson. O seguro saúde dele e da dona Mina não é mais o convênio de saúde da escola, mas particular. São R$ 2.400,00 ao mês. Sua aposentadoria cabe aí. Além disso, tem as despesas com alimentação, medicação, IPTU, condomínio... os dois filhos ajudam como podem, mas um deles está desempregado. A algumas semanas foi realizada uma reunião de condomínio para aumento da taxa condominial e rateio de obras por infiltração de água na garagem em razão das chuvas. Hoje ao passar pela portaria do prédio o síndico viu uma placa de “vende-se”, do apartamento do seu Dito.

Essa é a realidade de muitos brasileiros idosos, que por sorte, conseguem chegar aos 65 anos.

Após uma vida inteira de trabalho, contribuindo para o crescimento e a economia do país, o mínimo que se espera é que possam ter na velhice uma vida tranquila, digna e decente.

Por essa razão é extremamente preocupante ouvir falar da Reforma da Previdência Social, tal como está sendo veiculada. 

Causa indignação ver que um tema tão essencial na vida dos brasileiros, esteja sendo tratado com tanto descaso, inclusive, sem se fazer antes a Reforma Tributária e Trabalhista. O direito previdenciário é um dos direitos fundamentais do trabalhador, porque tem a ver com a subsistência e a dignidade da pessoa quando esta não tem mais condições e forças físicas para continuar trabalhando em razão da idade.

Dá repulsa ver o descaso com que Rodrigo Maia e camarilha estão tratando o assunto, apenas porque a Presidência da Câmara dos Deputados foi barganhada em troca da aprovação das Reformas, ainda que à revelia da população. 

A proposta de Reforma da Previdência tal como apresentada condena pessoas como o seu Dito a morrerem trabalhando. Em seu texto visa instituir um imposto compulsório ao trabalhador, do qual pouquíssimos conseguirão usufruir.

Entenda-se. Não sou contra as Reformas, não sou Fora Temer, sou contra a Reforma Previdenciária que está na mesa para ser votada pela Câmara dos Deputados e, à forma como ela pretende ser implementada, sem a participação  dos principais interessados: a sociedade.

Quando se trata de direitos fundamentais como o previdenciário, é inconcebível que a mudança se faça a fórceps; pelo contrário, mudanças dessa ordem têm que ocorrer no tempo e de maneira escalonada, neste caso, num prazo mínimo de uns 20 anos. 

Não dá para pretender que mudanças radicais nas aposentadorias passem a vigorar a partir de amanhã, empurrando a Reforma goela abaixo da população. Ainda mais sendo votada por um Congresso onde a maioria é réu e não tem credibilidade pública. O que é isso?!?

Mas o que há de tão terrível na Reforma?


Para começar, é uma blasfêmia propor que homens e mulheres, sem distinção, passem a ter direito ao benefício a partir dos 65 anos, sem que se isso seja amplamente debatido. E o pior! Estimar aleatoriamente que para adquirir o direito à aposentadoria integral o tempo de contribuição deverá ser de 49 anos. Ora, vejamos: quem comece a trabalhar aos 20 anos com carteira assinada, somente terá direito à aposentadoria com quase 70 anos.

Pergunta-se: Quantos estarão em atividade aos 70 anos?

Se pensarmos no mercado de trabalho, é sabido que aos 50 anos uma pessoa já é considerada velha e geralmente é substituída por uma de 20 anos, cujo salário é menor e é vista com maior capacidade laborativa. Uma pessoa que trabalha no setor privado não tem a estabilidade daquela que trabalha no setor público. Ela simplesmente recebe uma carta de demissão e é orientada a passar no Departamento Pessoal, sem nem ao menos receber um agradecimento ou aperto de mão pelo tempo de serviço.


Se pensarmos nas deploráveis condições do ambiente de trabalho em que muitos ainda trabalham (usinas, carvoarias, refinarias, agricultura, caminhoneiros...), não é preciso dizer que as doenças ocupacionais se desenvolvem e a expectativa de vida em muitas localidades brasileiras não chega aos 60 anos. 

Ocorre que, na conta de projeção gastos futuros com a Previdência do Governo, estão sendo computados também esses coitados que nunca chegarão a se aposentar (que não são poucos), porque morrerão antes, pela baixa qualidade de vida e laboral que sempre tiveram. Em razão disso, os números apresentados pela equipe econômica para justificar a famigerada Reforma, são falaciosos. Aliás, o Governo diz que essa é uma questão de "matemática simples". De matemática simples, onde?!? Essa é uma questão para a ciência atuarial. Não é apenas uma conta de 2 + 2 = 65 anos e 49 anos de contribuição.

O que está sendo proposto é inaceitável. A finalidade é meramente arrecadatória para cobrir os rombos que empresas sonegadoras, políticos e fiscais corruptos causaram à Previdência. A solução encontrada é dificultar, de modo revoltante, a concessão de benefícios a quem contribuiu para o sistema com uma vida inteira de trabalho, em especial aposentadorias e pensões.

Antes de qualquer Reforma da Previdência, o Governo tem que apurar e punir com multas e penalidades pesadas os bilhões que foram e estão sendo desviados em fraudes ao INSS; inclusive muitos clubes de futebol, que tanto ganham na negociação de jogadores ao exterior, são sonegadores contumazes da Previdência.

Você sabia que filhas “solteiras” de servidores públicos têm direito a uma polpuda pensão vitalícia do pai caso não casem?  Você acha que elas casam? Somente elas representam R$ 4,35 bilhões ao ano ao país, ao país não, ao contribuinte. Pergunto eu: Não é por aí que a Reforma deveria começar?

Maitê Proença, por exemplo, é filha de um Procurador de Justiça de São Paulo, Eduardo Gallo, que morreu em 1989. Ela foi casada com o empresário Paulo Marinho, um dos donos da Rede Globo, tem uma filha com ele, é atriz contratada da Globo e, pasme, ela recebe uma pensão vitalícia do pai no valor de R$ 13 mil ao mês. O destaque aqui não é a Maitê Proença, mas as Maitês na mesma situação. Isso é acintoso!!!

E as benesses da classe política? Após oito anos o senador pode se aposentar. E se for ex Presidente então, mesmo que corrupto, ainda tem direito a segurança privada, viagens, carros e toda sorte de mordomias pagas pelo contribuinte.

Você sabia que dados de 2015, fornecidos pelo Governo, apontam que o INSS, com 99,6 milhões de participantes (contribuintes e beneficiários), gerou um déficit da ordem de R$ 78,9 bilhões; e que no mesmo ano, o Regime Próprio da Previdência Social destinado aos servidores públicos, com apenas 9,6 milhões de participantes, gerou um déficit previdenciário da ordem de R$ 114,3 bilhões?!? Sim, o setor público comparado ao setor privado representa um ralo de desperdício. E a Reforma está voltada para penalizar quem? O setor privado!!!

Só o fim das super-pensões pode equilibrar as contas públicas, não o coitado que trabalha a vida inteira na iniciativa privada, muitas vezes fazendo “bico” sem registro em carteira para complementar a renda. O Governo tem que parar de dar privilégios com a mão esquerda e, tirar com a direita sempre dos mesmos, beneficiando as cigarras ao invés das formigas.

Você sabia que a aposentadoria de quem nunca contribuiu para a Previdência, como os trabalhadores rurais, sai do mesmo caixa daqueles que contribuem para a Previdência? Como é que a conta pode fechar? Para que você entenda: a Seguridade Social é formada pelo tripé: Saúde, Previdência Social e Assistência Social. Nada mais lógico que os benefícios daquele que nunca contribuiu, saiam do caixa da Assistência Social e não da Previdência, ora!

Verdade seja dita, está tudo errado no sistema previdenciário brasileiro.

Sou a favor de uma Reforma da Previdência sim. Mas de uma Reforma que reduza de forma drástica os encargos sociais e trabalhistas possibilitando a criação de empregos formais, ampliando a base de contribuintes do sistema. Mas um sistema privatizado, não gerido pelo Governo, porque tudo que o Governo toca, ele destrói.

Privatizar a Previdência? Sim, PRIVATIZAR, como outros países já fizeram!!! Criar um sistema com contas individuais de capitalização, ao invés do atual modelo coletivista e socialista de repartição, obsoleto e ultrapassado.  O Estado poderia oferecer algum tipo de benefício aos mais carentes, mas aqueles que contribuíram a vida inteira com o suor do seu trabalho, teriam assegurado o que pouparam. Cada um recebendo conforme o que efetivamente poupou. O modelo coletivo beneficia apenas os privilegiados do setor público, que são os que ganham mais do que a média salarial nacional e ainda se aposentam com uma série de regalias.

O sistema que existe hoje é um sistema de espoliação sob a capa de aposentadoria coletiva e, o que se quer fazer, é instituir um imposto ao trabalhador, sob a capa de Reforma.

Chega a ser uma piada de mau gosto que os defensores da Reforma digam que em outros países a idade mínima também é de 65 anos. Sorry, mas a realidade de uma Suíça e as condições de vida e laborais está anos-luz da do Brasil. A começar, lá o aposentado não tem que pagar por um plano de saúde particular que consome sua aposentadoria, pois o Estado lhe dá assistência médica gratuita de qualidade.

Não considerar a expectativa de vida dos brasileiros na Reforma, bem como, não incluir na conta sexo, local (região), faixa de renda... é improvisar. É inconcebível que a mulher seja tratada da mesma forma que o homem, considerando que após uma dura jornada de trabalho, ela ainda tem outra com os afazeres da casa, cuidando dos filhos, do marido, da faxina, das contas a pagar, do supermercado... Antes de fixar aleatoriamente a idade mínima em 65 anos, o Governo deveria ter debatido isso com a sociedade.

Quer arrecadar mais? Onere menos os empresários para que eles passem a contratar mais. A pesada carga tributária imposta aos empregadores representa, por baixo, 50 milhões de pessoas trabalhando na informalidade, sem carteira assinada e sem contribuir para a Previdência. Quem é empresário ou microempresário sabe do que estou falando.

A proposta de Reforma da Previdência Social que está sendo apresentada é fraca, mal acabada e dissociada da sociedade brasileira. Ela retira o "SOCIAL" como direito fundamental de todos os cidadãos.  Descaracteriza a sua história, que sempre foi a de garantir a subsistência e uma velhice digna para aqueles que envelheceram trabalhando, condenando-os a viver da caridade e esmola dos filhos e de terceiros para sobreviver. Por isso sou contra a Reforma que, Rodrigo Maia, enfática e cinicamente defendeu esta semana.

Agora o Governo está veiculando uma pesada campanha paga com o nosso dinheiro $$$$, com o slogan: “Sem a Reforma da Previdência, tchau Bolsa Família, adeus FIES...”. Isso é ter-ro-ris-mo!!! Apurem-se antes as fraudes na distribuição do Bolsa-Família e do FIES. Depois a gente conversa.

Em contrapartida, o slogan de quem contribuiu durante a vida inteira para conquistar o direito de se aposentar é: Com a Reforma da Previdência, tchau velhice digna, adeus aposentadoria...”.





Está pensando na aposentadoria? Mas você ainda não completou cento e vinte anos, completou?



Shadow/MariasunMontañés


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